terça-feira, 21 de julho de 2015

APRESENTAÇÃO DA COMISSÃO DE CANDIDATURA

António Sampaio da Nóvoa

Centro Cultural Olga Cadaval, 15 de Julho de 2015

 Minhas amigas, meus amigos
Permitam-me que inicie esta intervenção com um agradecimento especial ao General Ramalho Eanes e à Dr.ª Manuela Eanes, pela presença, pelo incentivo, pelo apoio, pela inspiração que representam para mim.
Quero deixar também uma palavra de grande reconhecimento ao Dr. Mário Soares e lembrar, com uma saudade imensa, a Dr.ª Maria de Jesus Barroso.
Ao Dr. Jorge Sampaio, os meus agradecimentos pelas palavras que me dirige, pelos conselhos, pela atenção, sempre presente, pela amizade.
São exemplos maiores de Portugal e da liberdade, da nossa vida democrática, exemplos que aumentam a minha responsabilidade, a minha obrigação de estar à altura de uma candidatura que é feita em nome de um país mais justo e mais solidário, com vida dentro, com esperança dentro, em nome de um país no qual cada português, cada portuguesa, tenha direito à felicidade e à dignidade.
Agradeço os testemunhos do Miguel Alves, do João Marecos e da Fernanda Rodrigues e a participação de todos os que aceitaram integrar a Comissão de Candidatura, uma comissão aberta, que irá integrando novos membros à medida que a campanha se for desenvolvendo.
Peço-vos que sejam promotores, dinamizadores, desta Candidatura, que reforcem as redes locais e temáticas, que discutam a Carta de Princípios, que angariem donativos, que organizem as actividades que vos pareçam mais adequadas para tornar esta campanha um exercício exemplar de cidadania.
Peço-vos que não fiquem à espera, que tomem a iniciativa, que agarrem esta candidatura nas vossas mãos, que façam dela uma “coisa nova”, uma candidatura da participação, dinâmica, alegre, feita com as pessoas, em conversas pelo país, em encontros, em diálogos, juntando cada vez mais portugueses e portuguesas, de todas as origens, de todos os lugares, das mais diferentes filiações.
É isso que temos de fazer. Colectivamente. Com energia. Com criatividade. Com entusiasmo. Está aqui a chave da nossa vitória.
Esta é uma candidatura que não se esconde, que não se enreda em calculismos e oportunismos, que não desvaloriza as presidenciais, transformando-as numa mera “segunda volta” das legislativas, que não usa as presidenciais para disputas entre os partidos ou dentro deles.
Esta é uma candidatura que tem a marca da liberdade e da independência, que procura dar voz às pessoas. Porque não quero falar pelos portugueses, quero ser o Presidente que dá voz, que dá visibilidade ao que ainda não se vê, que cria as condições para um novo espaço público democrático, de participação e de decisão.
Disse no Trindade, em Abril. Repeti no Rivoli, em Maio. Insisto agora, uma vez mais, para que não haja dúvidas: esta candidatura é independente, na sua raiz, na sua organização, na sua dinâmica. É feita de baixo para cima, não depende dos partidos, ainda que agradeça e deseje o apoio de todos – partidos, grupos, movimentos, pessoas – de todos os que se reconheçam na Carta de Princípios apresentada no Porto.
É este o meu ponto de partida, um ponto de partida que preserva a isenção e a independência do Presidente da República, que assegura a possibilidade de, no futuro, dialogar, em pé de igualdade, com todos os partidos. É esta a minha matriz, uma matriz a que não renunciarei, porque é aqui que bate o meu coração, é aqui que bate o coração desta candidatura.
 “Arrisque e siga sempre o seu coração” – disse-me o Presidente da Câmara Municipal de Paredes de Coura, num dos muitos encontros que tenho tido no país inteiro, do Norte ao Sul, do interior ao litoral.
Tem sido um tempo extraordinário da minha vida, no qual tenho conhecido a generosidade dos portugueses, do seu acolhimento, das suas palavras, com tantas pessoas que, no meio de enormes dificuldades, não desistem do país, não desistem de acreditar. É este o meu país, é este o país que quero ajudar a levantar, no respeito pela Constituição e pelos seus valores.
Minhas amigas, meus amigos
Permitam-me que registe duas impressões maiores, mais nítidas, das minhas voltas a Portugal.
 — A primeira é a devastação social e económica do nosso país, a pobreza extrema de tantos portugueses, o desemprego, o desespero que vemos nos olhos de muitos, o drama da emigração forçada.
Já não podemos dizer apenas meias-palavras, como se tudo isto fosse normal ou aceitável, como se tudo isto fosse fatalidade ou destino. Não é. Vivemos um momento excepcional,dramaticamente excepcional, das nossas vidas. Não podemos pactuar com esta mornidão, com uma tibieza que tudo justifica e que, pasme-se, até tem o despudor de dizer que estamos melhor. Não estamos.
Já não nos bastam as meias-palavras, precisamos das palavras inteiras, como aquelas que o Papa Francisco usou, agora, na Bolívia.
Às vezes, é o poder anónimo do ídolo dinheiro: corporações, credores, alguns tratados denominados “de livre comércio” e medidas de “austeridade” que apertam sempre o cinto dos trabalhadores e dos pobres. Outras vezes, é a imposição de padrões alienantes de consumo e de formas homogéneas de pensar, como se tudo o resto fosse proibido, como se não fosse possível pensar fora do dicionário reinante.
A política não pode ser sacrificada no “altar do dinheiro”, a democracia não pode desaparecer nos meandros da finança. A expressão “tem de ser assim, quer queiramos quer não” é a própria negação da liberdade. Porque a política não serve para justificar o que existe, serve para abrir novos possíveis, novos futuros, serve para mudar, e não para que tudo continue na mesma.
 — A segunda impressão das minhas visitas pelo país é que os portugueses se sentem abandonados, como se os políticos, a começar pelo Presidente da República, tivessem desistido deles, tivessem desistido de os proteger.
Há muitas promessas que não posso, nem devo, fazer, mas o compromisso de estar sempre ao lado dos portugueses, sobretudo dos mais desprotegidos, é um compromisso solene, absoluto, que quero assumir por inteiro.
Como Presidente da República estarei presente em todos os combates pela igualdade e pela justiça social, pela dignidade da vida humana, serei um Presidente presente, um Presidente que não se afasta, que não se isola, um Presidente que faz do cuidar a sua magistratura.
Os portugueses precisam de um Presidente da República que defenda sempre o interesse nacional, que reconstrua o nosso orgulho no país, um novo patriotismo democrático, moderno, um Presidente que esteja à altura dos tempos difíceis que nos aguardam, que tenha nervos de aço, que saiba agir com independência, com um sentido agudo do bem comum.
Só assim se pode reconstituir o prestígio da função presidencial, dar uma vida nova à Presidência, transformar Belém num lugar de todos os portugueses, num lugar que todos os portugueses sintam como seu.
 Minhas amigas, meus amigos
No momento de crise que vivemos, importa fazer a pergunta: Como é que um Presidente da República pode responder aos novos desafios sociais e políticos, às dificuldades dos tempos que aí vêm?
Uma parte da resposta encontra-se  na matriz da minha candidatura. Se em 1986 se verificou a transição de um presidente militar para presidentes civis, durante 2016 podemos assistir à transição de presidentes oriundos da vida partidária para um Presidente que vem da sociedade civil não-partidária. É uma evolução natural, e sem contradições, como se percebe claramente no apoio que esta candidatura recebe de Ramalho Eanes, de Mário Soares e de Jorge Sampaio.
Porque é que este novo tipo de presidência pode ser útil no actual momento histórico?
Por uma razão simples: não tendo origem na vida partidária, disponho de maior liberdade para dialogar com todas as forças sociais e políticas e para, com elas, celebrar compromissos de futuro para Portugal.
O Presidente não legisla nem governa, e, por isso mesmo, deve comprometer-se a construir, com os portugueses e com os seus representantes, um contrato pelo futuro da República, um contrato que pense o país no longo prazo, mas sem deixar de definir linhas para uma acção imediata.
 Minhas amigas, meus amigos
Na segunda parte da minha intervenção, focarei, brevemente, quatro pilares essenciais deste contrato.
– Em primeiro lugar, a Europa.
Não nos podemos resignar perante o que se está a passar na Europa. É inaceitável que, a pretexto de dificuldades financeiras de um dos Estados-membros, se pretenda interferir nas decisões soberanas de um povo ou humilhar as instituições que democraticamente o representam.
A União está a afastar-se, perigosamente, dos valores que deram corpo ao processo de integração europeia, valores que impõem a coesão económica, social e territorial, que impõem a solidariedade entre os Estados-membros, o respeito pela igualdade entre os países.
Respeitar os tratados não se resume, como alguns pretendem, ao cumprimento das regras da União Económica e Monetária. É muito mais do que isso: é cumprir todas as normas que os constituem, garantindo que o processo de integração não degenera no exercício de poder de uns Estados sobre outros.
Impõe-se um debate profundo sobre esta questão, envolvendo todos os portugueses, e não só as elites políticas ou económicas, um debate que o Presidente da República pode, e deve, promover, construindo um compromisso nacional em torno da nossa posição sobre a mais do que necessária reformulação institucional da União.
Não podemos assistir, em silêncio, a este regresso aos tempos de cólera, como se todos fôssemos rivais e até inimigos. Somos europeus, sim, mas não desta Europa, que de “casa comum” se transformou em “campo de batalha”. Não há apenas um problema grego, ou português, ou finlandês, ou francês, ou inglês, ou alemão. Há, sobretudo, um problema europeu. Temos de o reconhecer e de o enfrentar, sem medo.
 – Um segundo compromisso deve estabelecer-se em torno da questão da dívida.
As diferenças partidárias sobre esta questão não podem impedir, antes devem reforçar, uma posição sólida e forte de Portugal no debate sobre a dívida que, dentro em breve, acabará por se impor, como bem se percebe pelas últimas posições do FMI.
Todas as forças políticas devem participar neste debate, num horizonte de longo prazo, encontrando soluções realistas e viáveis para a resolução de um problema que não é meramente conjuntural, nem meramente nacional.
Mas, num outro plano, ao percorrer o país, percebi também como o endividamento privado está a afectar a vida de milhares e milhares de pessoas e de pequenas e médias empresas. É urgente encontrar soluções para libertar a economia e as empresas e para aliviar a pressão da dívida sobre os portugueses, tema que se prende directamente com o…
 – … terceiro pilar [que] diz respeito ao conhecimento e à modernização da economia, sobre o qual já falei em anteriores discursos.
No curto prazo, deve haver apoio político e social para superar as medidas recessivas e encontrar, no limite dos recursos disponíveis, os consensos possíveis em torno de estímulos à economia.
Mas uma estratégia de futuro deve ir mais longe e traçar as grandes linhas do nosso modelo de desenvolvimento. Uma presidência de tipo novo pode ajudar a encontrar compromissos entre forças partidárias e sociais, compromissos que liguem o conhecimento à economia e à sociedade, que promovam o “crescimento verde” e sustentável.
É preciso criar inovação nos sectores tradicionais e nas novas fileiras económicas, essencial tanto para o desenvolvimento interno do país como para o aumento das exportações.
Assente no diálogo social, um trabalho constante com as universidades, as autarquias, as empresas e o terceiro sector, pode ir incorporando ciência e tecnologia no tecido económico, criando as condições para qualificar o trabalho, para pôr fim ao desperdício dos nossos jovens mais bem preparados e mais dinâmicos. Sem isto, não há futuro para Portugal.
 – Finalmente, o quarto pilar prende-se com as políticas de emprego, redistribuição e combate à pobreza e à desigualdade.
É objectivo central desta candidatura que a dignidade do trabalho seja respeitada e que a solidariedade seja um objectivo constante da nossa acção. Com coesão social e territorial. Com respeito pelas autonomias regionais. Com coesão nacional.
Um Presidente da República não pode ficar em silêncio perante tantas situações dramáticas, de pobreza e de desemprego, perante o aumento da pobreza infantil, perante portugueses que trabalham – muitas vezes duramente – mas continuam a ser pobres.
Não deixarei de denunciar estas situações. Mas como Presidente tenho a obrigação de fazer mais, tenho de ajudar a construir, sem me substituir ao Parlamento ou ao Governo, compromissos nacionais em torno do combate às desigualdades, ao desemprego, à desertificação e ao despovoamento das zonas rurais.
Ninguém pode ser Presidente se não estiver disposto a travar uma batalha diária contra as injustiças sociais. É isso que farei, sem descanso, pois essa tem de ser a causa maior de um Presidente da República, a causa que ilumina todas as outras.
Minhas amigas, meus amigos
É tempo de concluir.
Uma presidência de tipo novo, alicerçada numa candidatura independente e suprapartidária, possui, à partida, condições especialmente favoráveis para construir novos entendimentos de futuro, para abrir o leque das alianças possíveis entre partidos.
Uma presidência de tipo novo pode trazer mais pessoas para dentro da política, inscrevendo novas presenças, nos partidos e para além deles. Uma democracia da escuta, da participação, da cidadania da palavra, uma democracia do século XXI, da liberdade, dos valores republicanos da igualdade, do respeito pelo bem público, de construção daquilo que nos é comum.
Uma presidência de tipo novo, sem amarras, que exija um combate mais duro à corrupção, não permitindo nunca que o Estado seja capturado por interesses privados. Há política a mais nos negócios e negócios a mais na política.
Insisto no que disse no princípio. Vivemos um momento excepcional, dramaticamente excepcional, das nossas vidas. Em Portugal. Na Europa. No mundo.
Queremos que tudo continue na mesma? É fácil, basta votar nos mesmos, nos mesmos de sempre, com mais vírgula ou menos vírgula.
Ou queremos abrir a possibilidade de um tempo novo, de uma nova relação entre a política e os cidadãos? Neste caso, uma presidência de tipo novo pode ser o lugar da mudança, pode ser o princípio de um caminho de esperança e de futuro para Portugal.
Há muitos que nos lembram, todos os dias, que não somos nada, que nada valemos, que nada podemos, que Portugal não pode nada, que o Presidente da República nada pode, que ninguém pode nada.
A estes devemos dizer – Acordai.
Acordai
raios e tufões
que dormis no ar
e nas multidões
vinde incendiar
de astros e canções
as pedras do mar
o mundo e os corações
É isto que peço a todos nesta campanha – Acordai.
E acordar quer dizer acreditar, trazer toda a vossa força para dentro desta campanha, toda a vossa energia, as vossas ideias, sugestões, iniciativas, toda a luz das vossas convicções, dos vossos corações.
Acordar quer dizer discutir, falar, constituir arenas públicas, pelo país todo, para ouvir, para conversar, para pensarmos uns com os outros. Porque “fazer pensar é tudo; e a agitação a única alavanca que pode deslocar o mundo: pois agitar quer dizer – instruir, ensinar, convencer e acordar”.
É verdade que, muitas vezes, as coisas parecem maiores do que nós, mas não são, nunca são. Podemos muito mais do que nos dizem, muito mais do que nos querem fazer crer.
E sabemos todos que é raro ter na vida a oportunidade de servir uma causa tão grande como aquela que hoje aqui nos traz. Não temos o direito de a desperdiçar. Temos de a agarrar, com as mãos inteiras, com o coração inteiro.
Obrigado, meus amigos. Obrigado, minhas amigas. É tempo de fazer tudo, é tempo de dar tudo pelo nosso país, de dar tudo por Portugal e pelos portugueses.
Viva a República! Viva a Liberdade! Viva Portugal