domingo, 23 de agosto de 2015

O QUE HÁ DE NOVO ?

O sempre atual Eça de Queirós, imaginando o encontro do Ano Novo com o Ano Velho sob as muralhas de Elvas, descrevia um Ano Velho aportuguesado: entre outros tiques, perguntava constantemente “o que há de novo?”.
Século e meio depois, o que há de novo?
Quem acompanhou a visita de Sampaio da Nóvoa na sua visita à Madeira e Porto Santo notou decerto que há algo de novo. As suas intervenções, para além das vertentes da cultura e da elegância de estilo que se lhe reconhecem, destacaram-se completamente do discurso convencional. Daquilo que os franceses chamam “langue de bois”, decerto inspirados no badalo de madeira montado no interior do chocalho das pacíficas vacas. Aliás, as vacas não servem só para acionar chocalhos: o seu olhar ternurento também inspira certas almas poéticas…
A intervenção final se Sampaio da Nóvoa na Universidade da Madeira foi, dentro dessa perspetiva, modelar: focou-se em princípios, e em época de crise a salvaguarda dos princípios é mais que fundamental: é vital. Porque do seu respeito depende a sobrevivência da nossa sociedade tal como a entendemos, e nenhuma conjuntura pode pôr em causa aquilo que é estruturante. E na enumeração das liberdades – de pensar, de agir, de participar, de se associar – deixou um rasto do que é mais importante como sequela de um discurso político: algo para refletir, e não para transformar em palavras de ordem.
George W. Orwell, na sua célebre obra Animal Farm (O Triunfo dos Porcos, na tradução portuguesa), descrevia a atuação dos carneiros da quinta libertada: balindo, à ordem, “quatro pernas bom, duas pernas mau”. Só isso.
Já temos a nossa dose de chocalhos e carneiros.
Por isso, e não só por isso, Sampaio da Nóvoa traz algo de novo.
Para que se enterre de vez aquele Ano Velho, palpando a face, e dizendo (nem perguntando) “o que há de novo?”.

Nuno Santa Clara